4 de julho de 2009

A "Santa" Inquisição



Mesmo antes de oficializada, a Inquisição já actuava por toda a Europa castigando todos aqueles que considerava “demónios da heresia”, arrebanhava adeptos disseminando o conceito de que os perturbadores da Ordem não podiam coexistir com a Igreja Romana. Mas, muitos desses heréticos eram simples clérigos bem-intencionados, que apenas desejavam reformar o que consideravam excessivo dentro da Igreja, clamando a volta à piedade humilde de Jesus e seus discípulos, enquanto que o Vaticano cercado de Pompa Imperial, enorme poder político e “poder espiritual” gastava energias envolvendo-se em intrigas da corte.



Para os reformistas, que consideravam a igreja dispensável e acreditavam que o Reino de Deus estaria no coração de cada um, a Igreja deu o seu recado: organizou o primeiro grande Tribunal Público Medieval contra a heresia em Orleans em 1022. Os réus? Evidentemente os reformistas que pregavam, dizendo aos quatro cantos do mundo que, para encontrar Deus não seria necessário um Templo de Pedras, muito menos a pompa Imperial da Igreja.

Em inúmeros Tribunais Civis e nas temidas cortes da Inquisição, a acusação era sinónimo de condenação e a condenação uma sentença de morte das mais variadas; flageladas e mutiladas pelos torturadores, a carne dilacerada e os ossos partidos, as vítimas confessavam coisas absurdas; os que tivessem sorte seriam decapitados ou mortos de maneira relativamente mais humana antes que os seus corpos fossem reduzidos a cinzas em fornos. Os mais infelizes, eram queimados vivos em fogueiras de madeira verde para que a agonia se prolongasse.

Os inquisidores estavam ali enquanto o fogo martirizava a vítima, e incitavam-na, piedosamente, a aceitar os ensinamentos da "Igreja" em cujo nome ela estava sendo tratada tão "delicadamente" e tão "misericordiosamente".

Para que houvesse um contraste com a tortura pelo fogo, também praticavam a da água: "Amarrando as mãos e os pés do prisioneiro com uma corda trancada que lhe penetrava nas carnes e nos tendões, abriam a boca da vítima à força e despejavam dentro dela água até que chegasse ao ponto de sufocação ou à confissão.”

Todas as imaginações bárbaras do espírito de Dante, quando descreveu o Inferno, foram incorporadas em máquinas reais que cauterizavam as carnes, esticavam os corpos e partiam os ossos de todos aqueles que recusavam crer na "branda misericórdia" dos inquisidores.



Foi uma verdadeira passagem de terror, que durou aproximadamente 300 anos ceifando a vida de milhares de inocentes que não tiveram nem a opção de lutar pela sua própria liberdade de expressão. Esse onda de ódio e homicídios alastrou-se como fogo, incendiando a vida civilizada; França, Itália, Portugal, Alemanha, Espanha, Países Baixos, Inglaterra, Escócia, Áustria, Noruega, Finlândia, Suécia e por um breve período, saltaria o Atlântico inflamando até o Novo Mundo.

A seita denominada Waldenses – por causa do seu fundador, Peter Waldo, que traduzira o Novo Testamento sem autorização – foi alvo de perseguição por parte da Igreja mesmo antes de a Inquisição ter realmente começado. A Inquisição perseguiu os Waldenses, cujos pregadores itinerantes faziam votos de pobreza, por quase todos os cantos da Europa. Típico foi o destino dos adeptos que buscaram refúgio nos Alpes franceses, a inquisição cercou-os acusando-os injustamente de invocarem demónios, provocarem tempestades, comerem carne humana e envolverem-se com outros procedimentos heréticos; do pouco que se sabe, 110 mulheres e 57 homens teriam sido condenados e queimados vivos.

Quem cometesse erros na interpretação das sagradas escrituras, quem criasse uma nova seita ou aderisse a uma seita já existente, quem não aceitasse a doutrina Romana no que se refere aos sacramentos, quem tivesse opinião diferente da igreja de Roma sobre um ou vários artigos de Fé e quem duvidasse da fé Cristã, todos eram torturados barbaramente.



Sorrir era proibido! O tom sério afirmou-se como a única forma de expressar a verdade e tudo que era importante e bom. O riso, por sua vez, era visto como a expressão viva do próprio pecado. O riso foi declarado como uma emanação do diabo. O cristão deveria conservar a seriedade sempre, para demonstrar o seu arrependimento e a dor que sentia na expiação dos seus pecados. É interessante notar que nas histórias infantis medievais essa articulação entre bem e sério e o mal e riso é fortemente representada. A menina que é boa sofre sempre e é tristonha; a bruxa ou feiticeira que é má está sempre a dar gargalhadas. Certamente que, seguindo o raciocínio moral da Idade Média, no final da história o sofrimento será recompensado e o riso castigado.

Houve tempo em que os bispos católicos ao invés de salvarem as vidas e as almas, enviavam-nas aos milhares para a morte.

Mas, até mesmo os clérigos não eram poupados, muitos eram acusados de envolvimentos com práticas ocultas mais elevadas, todo o costume que fugisse da tradição da Igreja era comparado a heresia. Esta foi uma época onde “reinava” a ignorância, poucos eram os que sabiam ler e escrever, privilégios de alguns ricos, nobres, escalões da igreja e certamente clérigos, sendo assim um clérigo era capaz de ler os antigos livros de magia que circulavam subtilmente entre os chamados heréticos.

Mesmo nos níveis mais altos da hierarquia eclesiástica e às vezes até nos altos escalões, ninguém estava a salvo dos raios fulminantes da inquisição. Frei Guillaume Adeline era prior de um importante mosteiro em Saint-Germaine-em-Laye, era também um conhecido doutor de teologia e foi acusado de prática de feitiçaria. Os inquisidores alegaram que fora encontrado com ele um pacto por escrito com o demónio. Para um intelectual de seu porte, mesmo numa situação de intensa dor e alto risco, as ofensas que foi obrigado a admitir devem ter parecido ironicamente ridículas: manter relações sexuais com um súcubo, voar montado numa vassoura, beijar o ânus de um bode. O Frei Guillaume Adeline foi queimado vivo.



A tortura e o temor distorciam a verdade, vizinhos acusavam-se mutuamente, cristãos denunciavam companheiros de religião, crianças testemunhavam contra os próprios pais, era família contra família, esposas acusavam os seus maridos, camponeses voltavam-se contra seus senhores, foi um reinado de horror, no qual para se sobreviver, muitas vezes era necessário acusar sem qualquer razão.

Numa cidade do norte da França chamada Arras, um grande centro manufactureiro, um pobre ermitão foi condenado a ser queimado como bruxo. Tentando escapar da tortura, ele prontamente denunciou uma prostituta e um velho poeta até então mais conhecido por seus poemas à Virgem Maria. Estes dois, por sua vez, acusaram outras pessoas e logo começaram as fogueiras.

E a Igreja foi a principal responsável pelas mudanças na atitude das pessoas e na política oficial que resultaram numa grande carnificina.

Os métodos para se extrair confissões não eram nada agradáveis, as pessoas não tinham benefício de um júri e também não tinham permissão de confrontar os seus acusadores, aliás nem chegavam a saber a identidade deles. As confissões eram extraídas de todas as maneiras possíveis, já que nos termos da lei canónica os réus só seriam condenados mediante confissão. Um exército de torturadores trabalhava diligentemente para atingir esse objectivo.



A Inquisição usava como método de obtenção de confissão a tortura e em alguns casos levava o torturado à morte.

Segundo Enry Thomas, grande historiador norte-americano, poderia ser escrito um livro somente sobre as torturas empregadas pela inquisição, embora nada agradável: “O prisioneiro, com as mãos amarradas para trás, era levantado por uma corda que passava por uma roldana, e elevado até o alto do patíbulo ou do tecto da câmara de tortura, de seguida, deixava-se cair o indivíduo e travava-se o aparelho ao chegar o seu corpo a poucas polegadas do solo. Repetia-se isso várias vezes. Os cruéis carrascos, as vezes amarravam pesos nos pés das vítimas, a fim de aumentar o choque da queda.

Depois havia a tortura pelo fogo. Colocavam-se os pés da vítima sobre carvão em brasa e espalhava-se por cima uma camada de graxa, a fim de que este combustível estalasse ao contacto com o fogo."

De acordo com a lei, tortura só podia ser infligida uma vez, mas essa regulamentação era burlada facilmente. Quando a Igreja desejava repetir a tortura, mesmo depois de um intervalo de alguns dias, alegava então que se tratava simplesmente da continuação da primeira tortura.

Uma das experiências mais chocantes que podemos viver é visitar um museu que expõe os instrumentos de torturas usados na Idade Média. É como entrar numa câmara de horrores. É quase impossível acreditar que aqueles objectos eram usados para ferir as pessoas. Aliás, visitar museus que expõem instrumentos de torturas de qualquer época histórica e de qualquer região do mundo é sempre uma experiência muito dolorosa, porque nos deparamos com a crueldade humana elevada a altíssima potência. São pessoas que abusam do seu poder para ferir outras pessoas que não podem se defender. A tortura é a expressão máxima da covardia humana, por isso é tão doloroso lidar com esse assunto.

O Juiz Heinrich Von Schulteis de Rhineland do século XVII, considerava a tortura agradável aos olhos de Deus. Ele chegou a cortar os pés de uma mulher e despejar óleo quente nas feridas abertas.

Agora, que opções tinham os réus? Pois eram torturados, se necessário até a morte, para confessarem qualquer absurdo, e quando confessavam eram queimados vivos ou teriam a cabeça decepada entre outras formas brutais e malignas de se tirar uma vida.

Quanto ao facto do réu não saber quem e porque o acusavam era uma manobra fria e crua da Inquisição para poder acusar quem muito bem entendesse, a saber pessoas com bens, os quais, após a sua morte, eram confiscados pela "Santa Igreja".

Falsas acusações, indulgências, pilhagens, saques tornaram a Igreja um Império Poderoso, tanto político quanto “espiritual”: o Vaticano um país dentro do território de outro país.

A arrogância clerical e os abusos de uma igreja corrupta tornavam-se cada vez mais insuportáveis. No início do século XIII, o próprio Papa afirmava que os seus respeitados sacerdotes eram “piores que animais refocilando-se em seu próprio excremento”.

Pescadores de dinheiro e não de almas”, com mil fraudes para esvaziar os bolsos dos pobres, assim eram descritos os bispos da época. De acordo com o legado papal na Alemanha, eles reclamavam de que o clero em sua jurisdição só sabia se refestelar de luxo e gulodice, não respeitava jejuns, fazia transacções comerciais, jogava e caçava. Eram enormes as oportunidades de corrupção, até para a realização de seus deveres oficiais exigiam dinheiro, casamentos e funerais sem pagamento adiantado não existia e antes de uma doação não se realizava comunhão, até mesmo os agonizantes ficavam sem seus últimos sacramentos caso algumas moedas não tilintassem no cofre. As famosas indulgências eram simplesmente uma renda extra.

Por ironia do destino, tempos depois, a igreja acusava a Ordem dos Cavaleiros Templários de toda a heresia possível, inclusive de homossexuais, mas esquecera-se que dentro da própria igreja toda essa heresia era um exemplo vivo, usurpadores, torturadores e também existiam os homossexuais. O próprio Arcebispo de Tours foi um homossexual notório que fora amante do seu antecessor e que exigiu na época que o bispado vagado de Orleans fosse concedido ao seu amante. Mas esse pequeno texto é apenas um detalhe do livro “A Inquisição” (Michael Baigent & Richard Leigh) entre outros, o que se torna bastante interessante quando comparamos.

Segundo o maior poeta lírico alemão da Idade Média (os livros alemães são importantes, mas raros e quase ninguém tem acesso), Walther Von der Vogelweide (1170-1230):
Por quanto em sono jazereis, Ó Senhor?...Vosso tesoureiro furta a riqueza que haveis armazenado. Vosso ministro rouba aqui e assassina ali, E de vossos cordeiros como pastor cuida um lobo”.

Em Novembro de 1207, o Papa Inocêncio III escreveu ao Rei da França e a vários nobres do alto escalão francês, obrigando-os a suprimir os “hereges” dos seus domínios pela força militar, em troca recebiam variáveis recompensas, desde absolvição de seus pecados e vícios, liberação de pagamento de todos os juros das suas dívidas, isenção da Jurisdição dos Tribunais Seculares, além de, é claro, todas as vantagens explícitas, ainda recebiam permissão para saquear, roubar, pilhar e expropriar. Deste modo surgiram batalhas uma após a outra, massacres, que segundo a Igreja eram conhecidos como “Guerra Santa” em nome de Deus, mas de um Deus que somente a igreja conhecia e beneficiava da sua protecção.



Assim teve início a Inquisição em pleno tumulto da Idade Média por um decreto papal de 1233 que oficializava a lei do Vaticano. Nos cinco séculos seguintes essa temível instituição continuaria consumindo o que julgava como inimigos da igreja, heréticos ou feiticeiros às centenas de milhares.

Na Provença, a inquisição varreu os Cátaros da face da terra, os cátaros abraçavam um extremo ascetismo e espalharam sua doutrina por boa parte do continente durante os séculos XII e XIII, eles acreditavam que o mundo físico estava impregnado pelo mal e tinha Satã como seu rei. De acordo com essa lógica, a Igreja Católica era também um instrumento do demónio e abomináveis eram todos os seus sacramentos. Muitos nobres abraçaram a sua fé, arrebanharam um número enorme de seguidores no sul da França. Os seus adeptos tornaram-se conhecidos como Albigenses (Albi – Provença). A sua importância crescente tornou-se um insulto intolerável para o poderio da Igreja Católica.

O seu longo braço estendeu-se por toda a França, depois da Itália e Alemanha. Na Espanha foi estabelecida sua própria inquisição, utilizando os mesmo métodos brutais para perseguir mouros, judeus, heréticos e qualquer grupo suspeito de prática de feitiçaria.

Assim teve início a verdadeira “arte de matar”, onde o palco era a fogueira, os acessórios eram os instrumentos de torturas e os figurantes eram o povo oprimido que não tinha a quem recorrer ou pedir protecção, porque o Deus que até então tinham conhecimento era o mesmo Deus que a Igreja utilizava-se para comandar a “Guerra Santa”.

Quando a carnificina atingiu o auge nos domínios germânicos, em meados de 1600, povoados inteiros eram dizimados de uma só vez. Segundo alguns relatos, o inquisidor da Saxônia, Benedict Carpzov assinou pessoalmente nada mais nada menos do que 20 mil penas de morte.

Contudo, grande parte dos documentos desses tribunais perdeu-se e o verdadeiro número de pessoas assassinadas nunca será revelado. De qualquer modo, tratou-se de uma experiência sombria, horrível e vergonhosa para a civilização e para o cristianismo.

Fonte: Mistérios Antigos


7 comentários:

  1. Luísa,
    eu sempre quis fazer uma postagem sobre o assunto mas sempre fatou-me coragem; sempre que tentei senti as dores dos torturados e o sadismo dos torturadores,
    Juntamente com as cruzadas e a caça aos discípulos de Arias, a Inquisição é um dos motivos para que eu não ser catolico, quero que a santa madre igreja se dane em seus conceitos egoítas e ditadoriais (há alguns meses, aqui no Brasil, vimos como como é aberrante o pensamento dos Bispos: uma menina foi estuprada, engravidou e corria risco de vida, somente um aborto poderia salva-la, a justiça forneceu a autorização para que fosse feito. O bispo local excomungou o juiz que deu a autorização, o médico que realizaou e à fámilia que solicitou a autorização e para o estuprador nada).
    Creio que ai, em Portugal, vocês devem ser católicos fervorosos, mas perdoe-me, como brasileiro e negro (que fomos escravizados por que a igreja chegou a conclusão de que não tinha-mos alma), eu abomino a Igreja.
    Acho que me alonguei demais, entaão é melhorparar te desejando um ótimo domingo e um grande abraço.

    humberto

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    Respostas
    1. Sinto da mesma forma, uma profunda agonia ao ler ou postar algo a respeito.
      Uma comoção em especial com as mulheres, que eram os alvos principais dessas perseguições, tortura e morte.
      Não consigo suportar por segundos, a imaginação daquilo que seria a vida delas naquela época.
      Roberto Nascente NoWhereMan: Facebook
      robertonascente@hotmail.com

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  2. Luísa, que texto fantástico. Eu adoro ler sobre história. Veja bem como era o passado tortuoso. Que vida horrível. Nós temos que dar graças a Deus pela liberdade em que nascemos e vivemos. Claro, que tem um malucos que entram em "igrejas" castradoras. Mas é opção. Pense que houve um tempo que até rir era pecado!!! É tudo um emaranhado que vai se perpetuando, tanto assim, a Inquisição durou, infelizmente, tempo demais. Eu fiquei lembrando do filme "Código da Vinci"... aliás, vou ver de novo!

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  3. Luiza, gostei muito do seu blog.
    Gostaria de indicar um filme que relata como uma inocente foi acusada pela inquisiçãoe como seconfessou culpada através da tortura. Aqui no Brasil o filme chegou com o nome: Sombras de Goia.

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  4. Anónimo,
    Obrigada pela informação do filme. É sempre muito bom quando há complementos aos posts, e esse é excelente com certeza. Eu não conheço, mas vou tentar encontrar em algum clube de vídeo.
    Abraços

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  5. LEGAU A HISTORIA MAS ISSO E TUDO MENTIRAS, A SANTA INQUISIÇÃO CONDENAVA OS ANTI-CRISTO, AQUELES QUE NÃO ACREDITAVAM EM JESUS CRISTO, EAS BRUXAS QUE MUITOS FALAM QUE ERAM CAMPONESES ISSO TAMBEM E MENTIRA ERAM AS PESSOAS QUE NEGAVAM CRISTO, EA ESCRAVIDÃO, FOI FEITA POR QUEM DESCOBRIU O BRASIL QUE ESCRAVISARAM OS INDIO E DEPOIS OS NEGROS, QUEM FOI QUE DESCOBRIU O BRASIL FORAM OS PORTUGUESES? ACHO QUE NÃO EM.

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  6. Yes... i also really like to visit new place, your idea is good.

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